Vanessa da Mata faz da felicidade uma arma quente no show "Vem doce"

30/05/2023 15h26


Fonte G1

Imagem: DivulgaçãoVanessa da Mata(Imagem:Divulgação)Vanessa da Mata

É sintomático que a última das 30 músicas ouvidas na estreia carioca do show Vem doce, de Vanessa da Mata, tenha sido Gente feliz (2017), parceria da artista com Maurício Pacheco e Russo Passapusso gravada há seis anos com o toque da banda BaianaSystem.

Ao aumentar a temperatura do canto no verso “A felicidade é uma arma quente”, ao fazer Comentário a respeito de John (Belchior e José Luiz Penna, 1979) mais em clima folk do que no andamento de xote da gravação com o astro do piseiro João Gomes, a cantora já tinha dado a pista do tom vivaz desse show que percorre o Brasil desde 5 de maio.

Com roteiro norteado pelo álbum Vem doce (2023), lançado em 8 de março pela cantora e compositora mato-grossense, o show homônimo chegou à cidade do Rio de Janeiro (RJ) na noite de sábado, 26 de maio, e fez feliz a plateia que lotou a casa Vivo Rio.

Vem doce é show (bem) dirigido por Jorge Farjalla, encenador goiano que tem marcado presença na cena teatral brasileira. O fato de Vanessa da Mata ser conduzida em cena por um diretor de teatro deu ao show um polimento perceptível nos gestos e nos movimentos da cantora pelo palco decorado com cenário frugal, tropical, em sintonia com a estética visual do disco Vem doce e com referências do modernismo de Oswald de Andrade (1890 – 1954).

A teatralidade do show é leve, sem tornar o diretor mais importante do que a artista, mesmo nos instantes mais dramáticos, como o momento em que a artista arranca parte do figurino, como se estivesse se libertando de um jugo, após cantar Face e avesso (2023), música em que a compositora descortina a falsa moral social em versos politizados.

Antes de a cantora entrar em cena para afiar o discurso do afrobeat Foice (2023), espécie de overture com sons cinematográficos, típicos dos filmes de aventura, preparou o clima, sem afinidade com o que a artista apresentaria na sequência, em cerca de duas horas, ao seguir roteiro essencialmente autoral.

Uma das boas surpresas desse roteiro foi Onde ir (2002), canção composta e interpretada no devido tempo de delicadeza, com a cantora sentada em adereço do cenário. Onde ir é música do primeiro belo álbum da artista, Vanessa da Mata (2002), título alien na discografia da artista pela sonoridade suave e mais atemporal.

Desse disco de estreia, a cantora também pescou Case-se comigo (2002), parceria com Liminha, também coautor da música que popularizou a cantora, Ai, ai, ai... (2004). Esse megahit surgiu remodelado no segundo ato do show. De início, Vanessa da Mata cantou Ai, ai, ai... deitada, em tom leve, relaxado, quase dengoso. Funcionou tão bem que nem era preciso retomar o habitual estilo extrovertido da interpretação no segundo momento do número.

A divisão do show em dois atos, com a cantora voltando à cena com outro figurino, foi boa marca posta por Farjalla na cena de Vem doce.

Após entrar na roda da Bahia com o samba Ê senhora, lançado por Maria Bethânia no álbum Encanteria (2009) e até então inédito na voz da autora, Vanessa saiu de cena. Foi quando o público viu interlúdio que gerou imagem memorável do show. Enquanto ouvia-se a récita dos versos de A força que nunca seca (1999) na voz de Chico César, parceiro de Vanessa nessa canção que apresentou a compositora ao Brasil no canto da recorrente Maria Bethânia, a vocalista Ju Miranda atravessou o palco com lata na cabeça ao som das notas da bela melodia, salpicadas pelo piano do tecladista Rodrigo Braga. Inesquecível!

Presença reluzente em cena, Ju Miranda também fez gracioso jogo de cena com Vanessa ao encarnar a personagem perfilada no samba Amiga fofoqueira (2023).

A propósito, Vanessa da Mata sempre caiu no samba com desenvoltura, em cadência própria. Tal habilidade foi reiterada em números como o samba-rock Oi (Vanessa da Mata e Marcelo Camelo, 2023), Me liga (Vanessa da Mata e Dom Lucas, 2023) – este com direito aos notórios rodopios da artista pelo palco – e Quando um homem tem uma mangueira no quintal (2009).

Em momento de interação com a plateia, Vanessa explicou a divisão dos versos do refrão de Gêmeos (2023) na melodia do reggae, gerando cumplicidade com o público, mantida quando deu voz à tocante balada Amado (Marcelo Jeneci e Vanessa da Mata, 2007) sentada na beira do palco.

E por falar em baladas, a segunda parceria da compositora com Ana Carolina, Eu repetiria (2023), cresceu muito no show em relação à gravação do álbum Vem doce (2023). O refrão ecoou forte por todas as dimensões da casa Vivo Rio.

Fique aqui, balada composta e gravada pela artista com o rapper L7nnon, também surtiu efeito, com o tecladista Rodrigo Braga se saindo bem ao dar voz ao rap inserido por L7nnon na canção. Já o reggae Fogo (2023) esteve longe de provocar o calor atiçado por hits inevitáveis como Boa sorte / Good luck (Vanessa da Mata e Ben Harper, 2007) e Só você e eu (2019), sucesso do radiante álbum anterior da artista, Quando deixamos nossos beijos na esquina (2019).

Só você e eu iniciou o bis após o show ter sido encerrado com o R&B tropical Vem doce (Vanessa da Mata e Papatinho, 2022), lançado em single em dezembro do ano passado e cantado no show após outra leitura do livro – escrito pela própria Vanessa – que a artista abrira no início do show antes de reviver a já mencionada canção Case-se comigo.

O bis também incluiu o antigo samba Não me deixe só (2022), petardo sempre certeiro, e o recente Se Eva soubesse (2023), samba bem menos aliciante, apresentado em maio como faixa-bônus do álbum Vem doce.

Fora do trilho autoral, Vanessa celebrou Gal Costa (1945 – 2022) ao entoar o refrão de Força estranha (Caetano Veloso, 1978). Foi bonito e forte, um número fora da curva de show calcado no pulso autoral e singular de cantora e compositora que veio sem manual ao irromper na música brasileira há vinte e poucos anos. Uma artista que transita com originalidade por baladas apaixonadas, sambas buliçosos, reggaes e pelo suingue do norte do Brasil, mote de Pirraça (Kassin e Vanessa da Mata, 2007), número que culminou com citação do carimbó Garota do tacacá (Pinduca, 1977).

Sob a firme direção musical do guitarrista Maurício Pacheco, condutor da banda que inclui o baixista Magno Souza, Vanessa da Mata fez a felicidade da plateia na estreia carioca do show Vem doce.

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Tópicos: show, vanessa, doce