Grazi Massafera: "Sou mulher, tenho tesão, namoro, não namoro, fico... Que julguem!"

28/03/2024 11h27


Fonte Revista Quem

Imagem: Marina ZabenziGrazi Massafera (Imagem:Marina Zabenzi)Grazi Massafera 



Grazi Massafera, de 41 anos, vem há algum tempo se redescobrindo como pessoa. Seu grande clique aconteceu durante a pandemia da Covid-19 ao ouvir um questionamento da colega Taís Araujo , o que fez com que repensasse toda a sua trajetória.

"A Taís me chamou na chincha e perguntou: Quando é que você vai continuar contando a sua história, mas de uma forma mais atualizada?. Pegou na minha mão, sem ser minha amiga ou de dentro da minha casa. Ela é uma mulher que olhou para outra mulher e falou: Bora com mais força? Você pode. Me acordou. Não é que eu tenha deixado de ser quem sou, mas renovei a forma de falar. Fui atrás. Foram dois anos de estudo com a historiadora Fernanda Felisberto para entender o lado da mulher, como um todo, da sociedade, como um todo, e não só o que contam para a gente na escola", relembra.

"Isso impacta nas minhas escolhas como atriz, sobre o que quero falar e o quão preparada estou para trabalhar. Só que preciso me transformar internamente para poder depois aflorar isso. Essa é uma escolha minha, só assim consigo assimilar as coisas na minha vida. Comecei na pandemia com esse estudo. Também pesquisando sobre cinema com Rodrigo Fonseca e fazendo muitas sessões intensas de análise. Não é gostoso. É uma reeducação. Isso vem me transformando e agora sinto maturidade para ir esmiuçando as coisas", explica.

"O tempo todo o mundo masculino está te descredibilizando - até sem consciência. É uma estrutura social. Te descredibiliza como mãe, como profissional e como mulher de forma passivo-agressiva"

Essa procura por um novo olhar diante das questões sociais tem influenciado nas suas escolhas profissionais, como o filme Uma Família Feliz. Ela vive Eva, uma mulher em um complicado puerpério, que não recebe o apoio do marido, Vicente (Reynaldo Gianecchini), e em meio a isso é acusada por sua comunidade de machucar os filhos. O suspense de José Eduardo Belmonte, que estreia dia 4 de abril nos cinemas, aborda o julgamento que as mulheres sofrem pela sociedade, principalmente em relação à maternidade.

"Quando uma mulher sai do padrãozinho família feliz, batalhadora, dócil e carinhosa é imposto o tempo todo que ela está louca. Não pode ter TPM mais intensa, questionar se quer ser mãe, chegar a uma menopausa e ter o seus hormônios abaladíssimos... O tempo todo o mundo masculino está te descredibilizando - até sem consciência. É uma estrutura social. Te descredibiliza como mãe, como profissional e como mulher de forma passivo-agressiva", diz ela, que está gravando a novela Dona Beja, da qual é protagonista, para o streaming Max (antigo HBO Max).

Estar sempre atualizada é algo que ela também faz por sua filha, Sofia, de 11 anos, fruto do casamento de seis anos que teve com o ator Cauã Reymond, de 43 anos.

"Ela é adolescente agora e tudo é novidade para mim. A minha mãe parou um pouquinho no tempo e é uma pena. Ela não quer ir junto com tudo o que está acontecendo. Tento me tornar interessante para conversar com a minha filha o tempo inteiro, em qualquer idade que eu estiver. Eu me reeduco e procuro me atualizar de tudo o tempo inteiro. Pela minha curiosidade como mãe e como mulher. Não coloco só essa obrigação de me renovar pela Sofia", ressalta.

"Tento não projetar nela minhas frustrações. Recebi muitas da minha mãe, que recebeu as da mãe dela"

Grazi diz que procura manter as expectativas para si. "Tento não projetar nela minhas frustrações. Recebi muitas da minha mãe, que recebeu as da mãe dela. Minha mãe foi uma mulher muito bonita, mas foi boia-fria e, depois, costureira. Ela projetou em mim que a beleza deveria ser uma alavanca na minha vida, algo que ela nunca usou. Foi uma projeção de mamãe. Fui lá e obtive sucesso para ela, mas depois disso há muitas consequências, vem um buraco, Quem sou eu? E agora? Onde estão os meus sonhos e o que eu quero?. Fui além do que ela esperava", relembra.

Educada pela boia-fria Cleuza Soares, em Jacarezinho, no interior do Paraná, Grazi foi orientada a usar a beleza para melhorar sua vida, mas após conseguir visibilidade, descobriu que podia ir mais longe.

"Sou uma mulher intensa, disposta a desbravar cada vez mais o feminino e tudo o que nele dói e é gostoso porque tenho uma menina também. E o véu caiu e não tem como colocar de volta. Acho lindo ser mulher, assim como acho lindo o universo masculino. Só penso que a gente tem que aprender muito a se complementar e não ser versus a versus. É uma utopia. Grazi é sonhadora. Nunca deixei de ser, mas sou muito corajosa e forte. Estou descobrindo tanta força aqui dentro. E não estou só", pontua.

Nascimento da Eva, de Uma Família Feliz

"Foram 22 dias muito intensos (de gravações de Uma Família Feliz). A gente tinha um valor estipulado, considerado de baixo orçamento, mas nem tanto assim. O set era muito leve, apesar do filme ser totalmente denso. As questões da Eva foram surgindo enquanto a gente foi fazendo o filme. De início, não estava escrito que ela estaria no puerpério, por exemplo."

Família feliz

"A Eva aborda essa questão de que para ter uma família constituída de sucesso é necessário ter a mamãe, o papai, os filhos e a alegria. Não temos problema aqui em casa. Ele (marido) me ajuda, é um pai maravilhoso. É mesmo? A relação é legal? Acredito muito em relações sadias. Meu irmão é assim. É lindo ver a relação dele com a minha cunhada. Já peguei ele querendo um dia quase amamentar o filho (risos). Ele não teve um pai assim, ele escolheu isso, ele olhou para o feminino (de forma diferente). Tem questões machistas, sim, eu fui criada dessa forma também. Mas lido com isso de forma diferente... Um dia a minha cunhada falou: Ah, tadinha. E eu, por quê?. Ah, não tem alguém. Respondi: Preciso de alguém para ser feliz?. É um complemento."

"Não credito a um relacionamento o motivo da minha felicidade"

Relacionamentos

"Claro que é legal estar em um relacionamento. Tive vários e foi bom. Mas eu não credito a um relacionamento o motivo da minha felicidade. Momentânea? Muitas vezes, mas sou mulher, tenho tesão, namoro, não namoro, fico... Que julguem. Estou abrindo caminhos para que outras mulheres também deem vazão aos seus desejos e a liberdade com o seu corpo."

Questões da personagem

"A Eva vai amamentar, não consegue, precisa de um tempo, mas não tem e dizem: Dá um nan (fórmula infantil para lactentes)!. Quer trabalhar e não deixar o lado profissional totalmente de lado, mas ela não consegue conciliar tudo e fazer o que ama. O trabalho dela é nada (para o marido). Quando vira mãe, a prioridade dela tem que ser essa - a mulher não pode falhar dentro de casa. E, além de tudo, tem essa projeção de fora de casa que tudo tem que estar lindo, como na internet."

"É importante a gente escolher parceiros e pessoas conscientes, além de ter em volta mulheres maduras que passaram por isso e que ajudem"

Puerpério

"Trabalhei muito durante o puerpério e, como toda mulher, tentei dar conta de tudo. E a gente não consegue dar conta de tudo. É uma questão hormonal. Por isso é importante a gente escolher parceiros e pessoas conscientes, além de ter em volta mulheres maduras que passaram por isso e que ajudem. Brinco que deveria ter um plano de saúde feminino para lidar com TPM fortes, que tenho muitas vezes, puerpério e menopausa. Os hormônios ficam muito alterados. E o que você escuta muitas vezes do parceiro? Está louca?. Isso agride e mostra o mínimo preparo dos homens de se relacionar com a mulher."

Julgamento da mulher

"É como se não pudesse ter uma vida e desejos fora da maternidade. Tudo tem que ser pelo filho. A gente já fica assim, com o coração fora do corpo, mas o equilíbrio é necessário. Eu me julguei também, mas tive amigas mulheres que me disseram: Você é mulher - pode e deve tirar um tempinho de férias só seu e sem culpa. Mas isso é um processo. Não dá para lidar com isso sozinha, realmente você se culpa por tudo e tem uma sociedade que te oprime para que você não seja um ser fora da maternidade."

Venho me encontrando neste lugar de dar liberdade para a minha filha ser quem ela quiser porque ela pode

Maternidade avassaladora

"A gente é bicho. Eu achava que não conseguiria fazer duas coisas ao mesmo tempo. Mas posso estar aqui falando com você e se ela (Sofia) passar engatinhando, a visão periférica vai para ela. É lindo, mas é perturbador. Não durmo mais como eu dormia. Qualquer barulhinho eu acordo. É a dor e a delícia. Sou canceriana, mãe pegajosa, quero abraçar e beijar."

Criação da filha

"Venho me encontrando neste lugar de dar liberdade para a minha filha ser quem ela quiser porque ela pode. Existem uns conceitos que a gente deve valorizar, como a liberdade com o seu corpo, o que você quer para você, se quer ser mãe ou se não, se quer usar essa roupa ou não. Ninguém deve ditar, mas é difícil porque a sociedade dita o tempo inteiro. É uma briga constante, na verdade, uma conscientização para mim."

Feminino

"Admiro muito o feminino. É lindo. A gente é de uma capacidade visceral. Eu dizia antes que não entendia as mulheres que não queriam ser mãe, hoje eu entendo. É necessária muita entrega. Não que as que escolhem não ser mães não sejam entregues. Elas escolhem se entregar a elas mesmas e isso também é lindo."

A mulher muitas vezes te ensina mesmo não falando palavras bacanas. Às vezes, ela te ensina através da própria dor dela

Sororidade

"Não adianta a gente esperar que alguém vá pegar na sua mão e falar, o mundo é assim. Mãe tem um pouco disso, é o que tento dar para a minha filha. Mas tem que ter discernimento e enxergar que a mulher muitas vezes te ensina mesmo não falando palavras bacanas. Às vezes, ela te ensina através da própria dor dela. Encontrei mulheres assim e procuro por mulher assim para me fortalecer. Estou aprendendo e me dou ao direito. Acho lindo o movimento de outras mulheres, tipo Paolla (Oliveira), Taís (Araujo), minha psicóloga, minha amiga Denise, o movimento da minha filha... Aprendo todos os dias."

Masculinidade tóxica

"É uma pena ver o universo masculino tentando bloquear e não querendo participar desta evolução (feminina). Daí inflama tudo e acontece tudo isso que a gente está vendo com mais potência, quantidade de estupro, de violência (contra a mulher)... O homem não quer sair deste lugar de todo-poderoso. Mas isso também passa por um lugar da gente mãe, que está educando filhos homens. Vale a nossa constante ree

Nascimento de uma atriz

"Entrei no Big Brother (em 2005) para ganhar dinheiro, precisava ajudar a minha família. A vida foi se movimentando e eu fui encontrando uma profissão que nunca imaginei que teria capacidade porque era subjugada como a miss burra e a loira e padrãozinho burra."

Julgamento como artista

"Uma vez escutei de um diretor: Quando você vai ser atriz?. É forte. Eu não me considerava uma atriz. Esse comentário foi um preconceito porque eu estava fazendo muita publicidade. Fiz muita publicidade e faço porque isso me dá uma condição financeira para poder escolher trabalhos como atriz. Não me afetava de forma que eu quisesse provar para o outro. Eu queria provar para mim."

Sou mãe, estou educando uma pessoa para a sociedade, trabalhando artisticamente questões sociais que foram despertadas em mim em Verdades Secretas e tendo consciência que o meu trabalho abrange socialmente as pessoas também

Escolhas profissionais

"Tirei o período da pandemia para me trabalhar. Fiz praticamente dois anos de estudo com a historiadora Fernanda Felisberto sobre estrutura de racismo no país. Faço parte de um padrão aceitável na sociedade, mas a gente tem o dever de imaginar, pensar, estudar e fazer a nossa parte (pelo outro). A gente precisa se conectar. É extremamente importante ter consciência de quem sou e de que lugar ocupo na sociedade. De alguma maneira, estou entrando na casa das pessoas. Alguns me admiram, outros nem tanto. Sou mãe, estou educando uma pessoa para a sociedade, trabalhando artisticamente questões sociais que foram despertadas em mim em Verdades Secretas e tendo consciência que o meu trabalho abrange socialmente as pessoas também. Não é só uma vaidade ou para pagar as contas."

Sonho de menina

"Eu sonhava em ser cinderela e achava que eu era. Depois sonhei em não ser mais e conquistei isso também. Deixei de ser Cinderela. Agora um sonho que eu sonhei quando era criança - e que continuo tendo - é ter uma fazendinha, tipo a Rita Lee, que foi para o meio do mato ficar com o bichos. Quero ter cavalo, que estou apaixonada, galinha, cachorro, gato, muitos bichos. Que a Sofia vá me visitar muito, mas viva a vida dela intensamente como eu vivi e vivo. E quero um relacionamento sadio e gostoso. É meu sonho envelhecer lá, mas também, se me der a louca, saio de lá e faço outra coisa. (Ser) Livre! Sempre com liberdade."

Créditos:
Fotos: Marina Zabenzi (@zabenzi)
Beleza: Gabriel Ramos (@gabrielramos6)
Texto: Marina Bonini (@marina_bonini)
Edição de texto: Camila Borowsky (@camila_borowsky)
Vídeo: Eduardo Garcia (@eduardogarda)
Estrátegia de redes: Mateus Phyno (@phynocomph_)

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Tópicos: mulher, grazi, sociedade