População aprova médico cubano, mas dorme em fila para exames no PI

18/09/2015 07h57


Fonte G1 P1

Um idioma diferente, a desconfiança da população e consultório improvisado numa sala de aula ou igreja. Este foi o cenário que os médicos cubanos Osmayki Martin Junco e Arianna Mallea Garcia enfrentaram quando chegaram em Cocal, no Litoral do Piauí, em outubro de 2013. Eles deixaram familiares e amigos em Cuba para construir uma nova vida prestando assistência médica no Piauí, através do Programa Mais Médicos, do governo federal.

Imagem: Gilcilene Araújo/G1Osmayki Martin examina gestante na comunidade Olho D?Água em Cocal.(Imagem:Gilcilene Araújo/G1)Osmayki Martin examina gestante na comunidade Olho D?Água em Cocal.

O G1 acompanhou o primeiro dia de atendimento de Osmayki e de sua esposa Ariana em 2013 e retornou ao município para verificar o que mudou na vida dos médicos e pacientes. Passados quase dois anos, os desafios da profissão são outros. Eles citam a ausência de medicamentos, aparelhos e equipamentos para realizar exames.

Até mesmo um simples hemograma (exame que avalia as células sanguíneas) é feito na cidade mais próxima, Parnaíba, que fica distante 64 km.Em 2013, as consultas eram realizadas numa sala de aula que foi transformada em consultório. A comunicação era feita principalmente por gestos, já que tanto médico como paciente pouco compreendiam o que cada um falava.

Imagem: Gilcilene Araújo/G1Clique para ampliarEm 2013, médico atendia em sala de aula na comunidade Olho D'água?.(Imagem:Gilcilene Araújo/G1)Em 2013, médico atendia em sala de aula na comunidade Olho D'água?.

A ausência de atendimento médico foi durante muitos anos um dos principais problemas enfrentados pelos moradores do povoado Olho’ d Agua, realidade que foi modificada com a chegada de Osmayki. Na época, a existência um clínico cubano foi bastante comemorada pelas pessoas simples da comunidade que não contavam com atendimento dos profissionais do Programa Saúde da Família há pelo menos quatro anos.

“Estamos felizes com a chegada dele porque antes era preciso se deslocar por duas léguas (15 km) para ser atendido, mas depois que o doutor cubano chegou isso mudou porque ele trabalha aqui perto de nós”, disse a dona de casa Francisca da Silva.

Ao longo destes quase dois anos, além de Osmayki e de sua esposa Ariana, outros quatro médicos cubanos e um brasileiro formado em medicina em Cuba chegaram à cidade através do Programa Mais Médicos. De acordo com Ministério da Saúde, há 351 médicos atuando no Piauí, sendo 277 cubanos, 30 brasileiros e 1 intercambista boliviano.A primeira modificação aconteceu no espaço onde eram feitas as consultas.

Agora elas acontecem em uma sala da Unidade Básica de Saúde (UBS), inaugurada em julho deste ano, que conta com sala para consultas, vacina e uma pequena farmácia. Outra modificação visível é a comunicação entre Osmayki e seus pacientes. Eles afirmam que já se adaptaram ao idioma do doutor.

Imagem: Gilcilene Araújo/G1Unidade de Saúde foi construída ao lado de escola onde eram feitos os atendimentos.(Imagem:Gilcilene Araújo/G1)Unidade de Saúde foi construída ao lado de escola onde eram feitos os atendimentos.

“Quando cheguei era difícil fazer consultas em local sem condições. Outro problema era conversar com eles, tinha que falar pausadamente para que pudessem compreender, mas faz tempo que já nos entendemos. Já conversamos normalmente.O problema é solicitar um exame e este não ser feito ou até mesmo demorar meses para ser realizado porque os pacientes não conseguem marcar no sistema”, frisou o cubano.

Falta de estrutura

Em Cocal, o G1 conversou com Osmayki e com um piauiense formado em medicina em Cuba e que participa do Programa Mais Médicos. Também ouviu um médico cubano na cidade de Joca Marques, localizada na região Norte do Piauí. Para eles, o principal obstáculo no atendimento básico de saúde é a falta de equipamentos para exames e consultas com especialistas.

Imagem: Gilcilene Araújo/G1Juan Ramon chegou em Joca Marques em  2013 e reclama da falta de estrutura.(Imagem:Gilcilene Araújo/G1)Juan Ramon chegou em Joca Marques em 2013 e reclama da falta de estrutura.

O médico cubano Juan Ramon chegou em Joca Marques em dezembro de 2013. A cidade está entre os 50 municípios com os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, tendo a saúde, saneamento básico e a geração de emprego como principais problemas apontados pelos moradores.

“Antes a coleta de sangue acontecia somente uma vez por semana. Depois que cheguei, solicitei que fosse realizada pelo menos duas vezes. A funcionária faz a coleta e leva para a cidade de Luzilândia, onde é analisado porque aqui não há laboratório. Quando se trata de um exame mais complexo encaminho o paciente para fazer em Esperantina ou Teresina. Sinto muito quando o paciente chega dizendo que não conseguiu fazer um exame por conta da distância”, afirmou Juan Ramon.

Em Cocal, as consultas e exames com médicos especialistas também são feitas em outras cidades. As marcações são feitas através da Central de Regulação e para conseguir uma vaga, muitas pessoas madrugam na frente da Secretaria Municipal de Saúde.

Madrugada na filaA aposentada Jesuína Rodrigues, 80 anos, utiliza o mesmo óculos há três anos. Ela conta que já não consegue enxergar com exatidão e por isso precisa falar com um oftalmologista. Depois de duas horas esperando numa fila, a aposentada saiu da secretaria com sentimento de frustação.

“Cheguei às 6h e já tinha umas 20 pessoas na fila, mesmo assim decidi ficar com a esperança de conseguir uma vaga para falar com médico, mas não deu. Não sei o que fazer porque esta é a terceira vez que venho tentar uma consulta e não dar certo”, lamentou.

Na mesma situação estava a dona de casa Maria do Socorro Brito, 59 anos. Ela também permaneceu na fila por duas horas em busca de uma vaga para fazer vários exames, porém retornou para casa sem marcá-los.

Imagem: Gilcilene Araújo/G1Pacientes retornam para casa sem conseguir marcar exames no Piauí.(Imagem:Gilcilene Araújo/G1)Pacientes retornam para casa sem conseguir marcar exames no Piauí.


A reguladora de consultas, Janaina Brito, explica que o sistema de marcações de consultas é feita pela internet. Segundo ela, a central fica em Parnaíba que oferta vagas para as cidades da região litorânea do estado.

“Infelizmente para conseguir uma vaga é necessário ter internet de qualidade, funcionários e computador com programas atualizados. Quando a central disponibiliza a vaga quem tem acesso a esses itens pega as primeiras vagas. E no nosso caso, somos somente dois funcionários e uma internet ruim para fazer todo o trabalho”, argumentou a funcionária.



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