'CEM é pior do que presídio', avalia Associação dos Advogados do Piauí

21/07/2015 08h19


Fonte G1 PI

O presidente da Associação dos Advogados Criminalistas, Paulo Afonso Alves, avaliou como gravíssima a situação do Centro Educacional Masculino (CEM) e que a solução efetiva seria a interdição do local. A declaração do jurista foi dada após a realização da vistoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional Piauí, na unidade socioeducativa na manhã desta segunda-feira (20).

"A situação do CEM é triste, pior do que no presídio. Esta unidade não tem condição de receber mais internos e de continuar como está, porque podemos ter outras mortes aqui. O governador tem que imediatamente resolver este problema, procurar outro lugar para internação dos menores",
declarou.

A vistoria da OAB-PI aconteceu devido a morte do adolescente Gleison Vieira da Silva, 17 anos, ocorrida no dia 16 dentro do alojamento que ele dividia com outros três menores coautores do estupro coletivo em Castelo do Piauí. Participaram também da fiscalização da OAB os representantes da Comissões de Segurança Pública e Direito Penitenciário, de Defesa dos Direitos Humanos e de Defesa do Direitos da Criança e do Adolescente.

Imagem: Catarina Costa/G1Clique para ampliarPresidente da OAB-PI negou intervenção do Centro Educacional Masculino.(Imagem:Catarina Costa/G1)Presidente da OAB-PI negou intervenção do Centro Educacional Masculino.

Para o presidente da Ordem dos Advogados no Piauí, Willian Guimarães, a interdição do CEM só agravaria o problema da falta de unidades socioeducativas no estado. Ele apontou como solução paleativa a reforma do antigo Centro Educacional de Internação Provisória (Ceip), que fica atrás do prédio.

"A ativação deste complexo conseguiria sanar o problema do CEM, mas é uma solução provisória até a construção de uma nova unidade. Precisamos imediatamente de um outro centro, porque a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente deve aumentar o período de internação de oito para 10 anos e em consequência a demanda de internos",
comentou.

Segundo William Guimarães, atualmente o Centro Educacional Masculino abriga 83 internos, 20 a mais do que sua capacidade. Outros problemas apontados pelo presidente durante a vistoria foram: falta de colchões em todos os alojamentos, insuficiência de educadores e estrutura precária, com uma fossa estourada numa das celas.

Do resultado da vistoria, o presidente da OAB-PI pretende elaborar um relatório, que será entregue ao governo do estado e a direção do CEM. "Vamos solicitar uma audiência com o governador e cobrar dele o investimento para a reforma deste centro como a construção de um novo. Soubemos que a União disponibilizou R$ 5,5 milhões para a nova unidade, mas que há risco de devolução do valor porque o estado não tem tido eficiência da aplicação desses valores. Não podemos aceitar este retorno", completou.

Imagem: G1 PIClique para ampliar Maurício Verdejo, promotor da 2ª Vara da Infância e Juventude.(Imagem:G1 PI) Maurício Verdejo, promotor da 2ª Vara da Infância e Juventude.

Uma reunião entre o Ministério Público e a Secretaria de Assistência Social e Cidadania do Estado do Piauí (Sasc) nesta segunda-feira (20) definiu a contratação imediata de mais profissionais para o Centro Educacional Masculino (CEM).

"Vamos buscar sanar as diversas falhas na estrutura do sistema, tanto ao que se refere a infraestrutura como pessoal. Na reunião de hoje, estabelecemos algumas prioridades como a contratação imediata de profissionais e reforma pontuais. Além disso, elaboramos metas de curto e médio prazo",
declarou Maurício Verdejo, promotor da 2ª Vara da Infância e Juventude.

Jovens confessam homicídio

Os três adolescentes que dividiam o alojamento com Gleison Vieira da Silva, 17 anos, assumiram a autoria do ato infracional de matar o jovem, pois a vítima entregou para a polícia os nomes dos envolvidos no estupro coletivo em maio deste ano.

Imagem: G1 PIClique para ampliarThais Paz(Imagem:G1 PI)Thais Paz

“Um dos adolescentes disse que foi apenas uma discussão que terminou na morte do Gleison, já os outros dois narram que a intenção era realmente matar o delator. Os adolescentes afirmam que assassinaram Gleison porque ele teria dito para a polícia que eles participaram do estupro coletivo sem terem envolvimento com o caso”,
afirmou a titular da delegacia do Menor Infrator em Teresina, Thais Paz, que informou abrir um novo inquérito e ouvir novas testemunhas.

Imagem: Ellyo Teixieira/ G1Clique para ampliarAdolescente espancado até a morte foi enterrado em Teresina.(Imagem:Ellyo Teixieira/ G1)Adolescente espancado até a morte foi enterrado em Teresina.

Vazam fotos

O gerente de internação do Centro Educacional Masculino (CEM), Herberth Neves, declarou que vai abrir uma sindicância para identificar os responsáveis pelo vazamento das imagens do adolescente Gleison Vieira da Silva, 17 anos, por companheiros de cela.

As imagens, que mostram o corpo ferido e o rosto de Gleison Vieira desfigurado, foram compartilhadas nas redes sociais. Herberth Neves quer saber se houve negligência por parte dos policiais ou educadores de plantão com relação a divulgação das fotos do garoto.

Ainda de acordo com o gerente de internação, os suspeitos de assassinar o adolescente admitiram o homicídio e não demonstraram remorso ou arrependimento ao relatar o ato criminoso.

Imagem: G1 PIClique para ampliarGleison Vieira da Silva(Imagem:G1 PI)Gleison Vieira da Silva

"Os acusados não falaram a motivação do crime, mas acredito que houve uma discussão entre eles e o Gleison, porque ele foi o delator do estupro. Os três confessaram ter matado o companheiro e explicaram como fizeram isso. Percebi a frieza deles em comentar o ato, como se fosse algo banal. Não demonstraram nenhum remorso ou arrependimento o que mostra o grau de periculosidade destes menores",
declarou.

Detalhes do crime

Segundo Herberth Neves, os adolescentes não utilizaram nenhum objeto para matar Gleison Vieira e que o crime aconteceu durante o banho."Um dos menores relatou que deu uma ‘gravata’ na vítima, para imobilizar e impedir que ela gritasse. Depois os três menores iniciaram uma sessão de espancamento, atingindo principalmente a cabeça de Gleison", falou.

Já o juiz Antônio Lopes, da 2ª Vara da Infância e Juventude em Teresina, afirmou que a agressão que culminou com a morte de Gleison deve ter sido iniciada enquanto a vítima dormia.

Imagem: G1 PIClique para ampliar'Poderia ter sido uma chacina', diz juiz sobre morte de adolescente no CEM.(Imagem:G1 PI)'Poderia ter sido uma chacina', diz juiz sobre morte de adolescente no CEM.

Chacina no CEM

O juiz Antonio Lopes da 2ª Vara da Infância e Juventude em Teresina comentou que o ocorido e disse que o Centro Educacional Masculino (CEM) poderia ter sido palco de uma chacina, já que os adolescentes vinham sendo ameaçados de morte pelos demais jovens da unidade.

“Eles (os internos) disseram que os agressores tiveram foi sorte, porque iriam matar os quatro. Poderia ter sido uma chacina. Há 14 anos vejo que o estado não tem cumprido o que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente, que é manter separados menores com alto grau de agressividade, a exemplo de estupradores, e quando há riscos para a integridade física deles”, disse o juiz.

Perfil da vítima
A história de Gleison é parecida com a de tantos outros jovens em conflito com a lei pelo Brasil: vem de família pobre, largou a escola no 3º ano do ensino fundamental, era envolvido com drogas e já tinha passagens pela polícia por furtos e roubo, o primeiro cometido aos 13 anos. As informações são da mãe do rapaz, Elizabeth Vieira, e do Conselho Tutelar de Castelo do Piauí, cidade localizada a 190 km de Teresina.

Antes da barbárie, Gleison vivia em uma casa pequena no bairro Refesa, periferia da cidade, com cinco irmãos, o padrasto e a mãe grávida de três meses. A renda da família é a aposentadoria do irmão mais velho, que tem problemas mentais, e mais R$ 270 do Bolsa Família.

Imagem: Patrícia Andrade/G1Casa do adolescente em Castelo do Piauí.(Imagem:Patrícia Andrade/G1)Casa do adolescente em Castelo do Piauí.

Elizabeth Vieira, 35 anos, conta que o filho “se desviou” quando tinha apenas 13 anos de idade. A mãe disse que sabia que ele usava drogas, mas não tinha ideia de como as comprava.

Gleison, segundo relatos do Conselho Tutelar, teve várias passagens pela polícia por furtos e roubos. Para a mãe, que amamentou o filho até os dois anos, o garoto sempre saía de casa dizendo que ia para o “videogame”.

Segundo relatos do delegado Laércio Evangelista, responsável pela investigação do estupro coletivo, muita gente em Castelo do Piauí comemorou a morte de Gleison.

Enterro em Teresina
Diante da possibilidade de reações hostis de moradores de Castelo do Piauí durante o enterro de Gleison Vieira da Silva, 17 anos, a família da vítima realizou o sepultamento do corpo do jovem nessa sexta-feira (17), no cemitério Santa Cruz, em Teresina.

A mãe do garoto, o padrasto e uma tia acompanharam o enterro. Policiais militares e conselheiros tutelares também estiveram no cortejo.

Imagem: G1 PIClique para ampliarMãe de Gleison gravou vídeo em Castelo do Piauí falando da morte do filho.(Imagem:G1 PI)Mãe de Gleison gravou vídeo em Castelo do Piauí falando da morte do filho.

Mãe grava vídeo

Elizabeth Vieira gravou um vídeo depois que soube do assassinato do filho. "Foi um choque muito grande porque eu não estava esperando. Recebi a notícia, é uma dor muito grande", disse.

A mãe da vítima disse ainda que acredita que a briga entre os jovens tenha sido motivada por causa dela. No vídeo, ela diz que ele a defendia muito. "Ele tinha que pagar pelo crime que cometeu, mas não desta forma", disse.

Destino dos outros três jovens
Após o crime, os jovens que são apontados como os autores do homicídio foram transferidos do CEM para o Complexo da Cidadania, na Zona Sul de Teresina. Representantes do Centro Educacional e da Justiça irão se reunir para decidir onde esses garotos irão cumprir o restante da suas medidas socioeducativas.

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