O retorno

07/05/2019 10h53


Fonte Rafalove

O ônibus estava lotado como poucas vezes aquele grupo de jovens havia visto na vida toda. Era noite e ainda por cima chovia torrencialmente, o coletivo estava abarrotado de trabalhadores rurais, canavieiros, peões e diversos “guerreiros” do endurecido e árduo cotidiano da zona da mata pernambucana. Mas algo diferente ocorreu naquela viagem, algo especial.
Os jovens se espremeram como puderam para entrar no ônibus, e dois dos mais fortes pressionavam as portas traseiras com suas costas para mantê-las abertas e não serem esmagados, e de frente um para o outro os braços se esticavam com bíceps contraídos para dar apoio e fazer uma barreira protetora para uma querida e pequena amiga, a qual um deles flertava há algum tempo.
A chuva e o frio os incomodava, mas a amizade e a sensação de aventura e desprendimento tornava o momento não um mero sacrifício, mas sim um desafio estimulante a ser vencido. O primeiro do grupo a adentrar não coseguiu sequer passar a catraca, tão lotado estava o ônibus. Ficou na catraca semi-girada, onde encontrou apoio na divisória de vidro e nas asas da “borboleta” para encostar o violão e iniciar canções desafinadas e alegres. Todos os jovens acompanhavam as canções, que passaram contrastar com o ambiente espremido e sério.
O efeito daquele “coral improvisado” era milagroso, ou no mínimo um fenômeno interessante: abreviou o tempo e amenizou a penosa viagem. Pouco a pouco os semblantes rígidos e contraídos dos passageiros relaxaram e tomaram feições amistosas. Alguns dos “guerreiros” mudos e sisudos partilharam o momento e juntaram-se ao coro, cantando de modo desafinado e alegre, junto ao ruído da tempestade, porém agradando a todos.
Até o cobrador perdeu o semblante de tédio e passou a “batucar” levemente com os dedos no caixa. De repente, o grupo de jovens estava conectado a completos estranhos pela magia da música e do bom humor. E assim prosseguiu-se até a capital, o destino final do grupo, que desembarcou com os corpos cansados e almas lavadas. Uma viagem longa que foi breve, um trajeto penoso que tornou-se uma pequena aventura. O regresso de uma comemoração junina que marcou para sempre os humildes e despretensiosos corações daqueles garotos.

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Tópicos: grupo, jovens, estava